Friday, July 20, 2007

[...] e não tardava Ana, impaciente, impetuosa, o corpo de campônia, a flor vermelha feito um coalho de sangue prendendo de lado os cabelos negros e soltos, essa minha irmã que, como eu, mais que qualquer outro em casa, trazia a peste no corpo, ela varava então o círculo que dançava e eu logo podia adivinhar seus passos precisos de cigana se deslocando no meio da roda, desenvolvendo com destreza gestos curvos entre as frutas e as flores dos cestos, só tocando a terra na ponta dos pés descalços, os braços erguidos acima da cabeça serpenteando lentamente ao trinado da flauta mais lento, mais ondulante, as mãos graciosas girando no alto, toda ela cheia de uma selvagem elegância, seus dedos canoros estalando como se fossem, estava ali a origem das castanholas, e em torno dela a roda girava cada vez mais veloz, mais delirante, as palmas de fora mais quentes e mais fortes, e mais intempestiva e magnetizando a todos, ela roubava de repente o lenço branco do bolso de um dos moços, desfraldando-o com a mão erguida acima da cabeça enquanto serpenteava o corpo, ela sabia fazer as coisas, essa minha irmã, esconder primeiro bem escondido sob a língua a sua peçonha e logo morder o cacho de uva que pendia em bagos túmidos de saliva enquanto dançava no centro de todos, fazendo a vida mais turbulenta, tumultuando dores, arrancando gritos de exaltação. [...]
[ raduan nassar | lavoura arcaica ]

Friday, July 06, 2007

disturbio do pânico.